Ciência x Câncer
No Reino Unido, boa parte dos clínicos gerais transcreve, após um atendimento, detalhes sobre o paciente e sua condição em um programa de computador. Os dados juntam-se aos de outras muitas pessoas em um sistema chamado Clinical Practice Research Datalink (CPRD). Esse serviço é uma enorme mina de ouro para quem investiga a incidência de diferentes enfermidades em grupos específicos. E foi aproveitado por experts da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, na Inglaterra, interessados na relação entre obesidade e câncer.
Com base no CPRD, eles seguiram 5,24 milhões de indivíduos, dos quais 2,5 milhões estavam com sobrepeso. Ao longo do tempo, 166 955 desenvolveram um dos 21 tipos de tumor mais comuns na Grã-Bretanha sendo o de vesícula biliar (embora mais raro, foi incluído pela suspeita de estar ligado à barriga avantajada). “Esse é o maior estudo a respeito do tema”, indica o epidemiologista Krishnan Bhaskaran, autor do trabalho. “Descobrimos que o sobrepeso está claramente associado a pelo menos dez dos cânceres analisados”, completa. São eles os de mama, endométrio, colo de útero, ovário, rim, vesícula biliar, fígado, cólon e tireoide, além das leucemias.
Ainda segundo o artigo, o acréscimo de um ponto no famoso índice de massa corporal (IMC) na média da população britânica resultaria em mais 3 790 casos da doença por ano. Mas de que maneira a gordura infla números tão preocupantes? “É improvável que exista uma única explicação! Estamos falando de cânceres bem distintos”, argumenta José Barreto Carvalheira, professor da disciplina de oncologia da Unicamp.
Obesidade x Câncer
Há vários mecanismos por trás do potencial da obesidade em deflagrar tantos tipos de neoplasia (o termo técnico para câncer). Porém, quase todos têm como ponto de partida os adipócitos, células para armazenar gordura, fabricam substâncias que regem o funcionamento do organismo. Quando os adipócitos estão cheios de gordura, eles intensificam a produção de proteínas inflamatórias e de certos hormônios, como a leptina, que se espalham pela corrente sanguínea. “Em excesso, eles promovem a multiplicação de células tumorais que, sem esse estímulo, talvez fossem eliminadas naturalmente”, esclarece o oncologista Fernando Cotait Maluf, do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes, em São Paulo. É como se o sobrepeso colocasse o pé no acelerador de nódulos malignos microscópicos.
Um adipócito inchado ainda gera quantidades extras de hormônios femininos. E a superdosagem deles também incita a proliferação de unidades defeituosas, em órgãos nos quais essas substâncias costumam agir, a exemplo do útero e das mamas. “Isso ajudaria a explicar o motivo pelo qual o câncer de endométrio é o mais afetado pela obesidade”, aponta Bhaskaran. “Para ter ideia, se uma mulher de estatura mediana ganha 13 quilos, aumenta em mais de 60% o risco de ela ser diagnosticada com esse problema”.
Outros que merecem destaque são os de fígado e vesícula biliar – 15,6% das ocorrências do primeiro e 20,3% das do segundo decorrem de uma cintura larga. Contudo, aqui não podemos apontar o dedo apenas para o tecido adiposo. Em alta concentração, as próprias moléculas gordurosas conseguem se infiltrar nesses órgãos. “O quadro dá origem a inflamações que, com o passar dos anos, levariam ao câncer”, desvenda Costa. Como dá para perceber, apesar da obesidade acarretar alterações sistêmicas, cada tumor se vincula com ela de um jeito distinto.
Diabetes x Câncer
Se por um lado a obesidade patrocina neoplasias diretamente, por outro deflagra o diabete tipo 2, que também prepara o terreno para elas. “A hiperglicemia termina em muitos radicais livres no organismo”, introduz Mário Saad, endocrinologista da Unicamp. Essas moléculas atacam o DNA e, assim, podem provocar mutações cancerígenas. Como se fosse pouco, sujeitos com sangue doce não raro exibem níveis estratosféricos de insulina nos vasos e já estudado que a superabundância do hormônio faz tumores crescerem.
Estilo de vida x Câncer
Agora, não dá para ignorar o fato de que os quilos a mais mascaram deslizes no estilo de vida capazes de abrir as portas para o câncer. O sedentarismo, para citar um deles, ao mesmo tempo que engorda, dispara por si só inflamações ameaçadoras. “É difícil separar o impacto isolado da falta de atividade física do de altos índices de massa corporal”, reforça Bhaskaran.
O mesmo acontece ao abordarmos a nossa alimentação. Vamos tomar como exemplo as carnes vermelhas. “Além de calóricas, elas, ao ficarem na grelha por tempo demais, passam a concentrar aminas heterocíclicas”. Descreve a nutricionista Rita de Cássia Castro, professora da Universidade Potiguar, em Natal.
Uma vez ingeridas, essas partículas entram em contato com o intestino, aumentando a probabilidade de um nódulo aparecer na região. Aí que está! Um fã de churrascaria, não dá pra saber se o excesso de peso proveniente de um cardápio desregrado ou se as tais aminas heterocíclicas presentes na carne é que desencadearam um eventual câncer.
“Por tudo isso o nosso coach Alessandro Assis, prova a importância de balancear a alimentação e praticar exercícios regularmente“. Seja por emagrecerem, seja por barrarem substâncias nefastas. Provavelmente pelos dois benefícios, ambos os hábitos são indispensáveis para nos prevenirmos de cânceres.
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